Que prodígio, ver publicanos transformados em apóstolos!

Grande, maravilhosa e profundamente desconhecida dos homens – a não ser daqueles que a experimentam – é a generosidade de Deus, a sua inefável liberalidade com os seus fiéis, mesmo enquanto habitam este vaso de corrupção. […] Quem poderá deixar de se maravilhar com as obras de Deus e de exclamar do fundo do coração: «Eu sei que o Senhor é grande» (Sl 134,5), quando passa, ou vê outros passarem, da avareza extrema à liberalidade, da prodigalidade à vida de abstinência, da soberba à humildade […]? São estas, de facto, as maravilhas divinas que a alma do profeta e daqueles que se lhe assemelham descobre com espanto numa contemplação cheia de milagres. Com efeito, poderá haver maior prodígio do que ver, num breve momento, publicanos gananciosos tornarem-se apóstolos, perseguidores ferozes transformarem-se em pregadores do Evangelho, prontos a tudo suportar e propagando a fé que perseguiam à custa do seu sangue? São estas as obras divinas que o Filho testemunha que realiza todos os dias, em união com seu Pai: «Meu Pai até agora trabalha, e Eu também trabalho» (Jo 5,17). Tais são as obras de Deus, que o bem-aventurado David canta no Espírito: «Bendito seja o Senhor, que é Deus, o Deus de Israel, Ele é o único a realizar maravilhas» (Sl 71,18). É delas que fala o profeta Amós: «Ele fez todas as coisas e as muda; transforma a sombra da morte em manhã» (Am 5,8 LXX). «Estas são as mudanças que produziu a mão direita do Altíssimo» (Sl 76,11 Vg), em relação às quais o profeta reza ao Senhor: «Confirma, ó Deus, o que fizeste em nós» (Sl 67,29 Vg) […]. Sim, é este o grande milagre de Deus, que um homem de carne tenha rejeitado todas as inclinações carnais, que no meio de tantas circunstâncias diferentes, de tantos ataques contra ele, tenha mantido a sua alma no mesmo estado de espírito e permanecido inamovível no meio do fluxo incessante dos acontecimentos.

São João Cassiano (c. 360-435) fundador de mosteiro em Marselha – Sobre a castidade, cap XII-XIII; SC 54

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