Beato Guerric de Igny (c. 1080-1157) abade cisterciense
Primeiro sermão para o Domingo de Ramos
O homem tinha sido criado para servir o seu Criador. Haverá coisa mais justa que servir Aquele que nos pôs no mundo, sem o qual não teríamos a existência? Haverá coisa mais feliz que servi-lo, pois servi-lo é reinar? Mas o homem disse ao seu Criador: «Não servirei» (Jr 2,20). «Então sirvo-te Eu», disse o Criador ao homem. «Senta-te e Eu servir-te-ei, lavar-te-ei os pés» […]. Sim, Cristo, «servo bom e fiel» (Mt 25,21), Tu foste verdadeiramente servo, servo em fé e verdade, em paciência e constância. Sem tibieza, lançaste-Te, qual gigante, na via da obediência (cf Sl 18,6); sem fingimento, deste-nos sobretudo, depois de tantos cansaços, a tua própria vida; maltratado, inocente, humilhaste-Te e não abriste a boca (cf Is 53,7). Está escrito e é verdade: «Aquele servo que, conhecendo a vontade do seu senhor, não se preparou ou não fez segundo a sua vontade, levará muitas vergastadas» (Lc 12,47). Mas, pergunto-vos, que ações dignas deixou por cumprir este servo? Que omitiu Ele do que devia ter feito? «Tudo o que faz é bem feito», comentam aqueles que observam a sua conduta; «faz os surdos ouvir e os mudos falar» (Mc 7,37). Mas, se cumpriu todas as ações que são dignas de recompensa, como sofreu então tanta indignidade? Ofereceu as costas ao chicote, recebeu uma quantidade inimaginável de chicotadas atrozes, por todo o lado o seu sangue correu. Foi interrogado no meio de opróbrios e de tormentos, como escravo ou malfeitor que é submetido a interrogatórios para que lhe seja arrancada a confissão de um crime. Ó detestável orgulho do homem que desdenha servir, a quem só humilha o máximo exemplo da servidão do seu próprio Deus! Sim, meu Senhor, pois muito sofreste Tu a servir-me, é justo e equitativo que, de ora em diante, tenhas repouso e seja o teu servo a servir-Te: chegou a sua vez. […] Venceste, Senhor, este servo rebelde; estendo as mãos para que mas ligues a Ti, curvo a cabeça para receber o teu jugo. Permite que Te sirva. Recebe-me como teu servo para sempre, ainda que servo inútil se não tiver em mim a tua graça; envia-ma, pois, do teu santo Céu, para que me assista nos meus trabalhos (cf Sb 9,10).