São Gregório de Nissa (c. 335-395)monge, bispo
Os olhos da pomba
«Como são lindos os teus olhos de pomba», diz o Esposo [do Cântico dos Cânticos] (Ct 1,15). […] O louvor que fazemos aos olhos [da Esposa] é dizer que são como de pomba. Eis o que, a meu ver, isso significa. Quando as pupilas são claras, quem as fixa pode ver nelas a própria face. Com efeito, os especialistas do estudo dos fenómenos da natureza dizem que o olho é impressionado pelas imagens emanadas pelos objetos visíveis e que é assim que se produz a visão. É por isso que louvamos a beleza dos olhos, dizendo que a imagem da pomba aparece na sua pupila: porque recebemos em nós mesmos a imagem daquilo para que voltamos o olhar. Quem não olha para a carne para o sangue, fixa o seu olhar na vida espiritual; como diz o Apóstolo, «vive no Espírito» (Gl 5,25), caminha segundo o Espírito; tornou-se inteiramente espiritual e já não físico ou carnal. Por isso, a alma liberta das paixões carnais testemunha que possui nos seus olhos a imagem da pomba, ou seja, que a marca da vida espiritual brilha na pupila da sua alma. Visto que tem o seu olhar purificado, tornou-se capaz de receber a imagem da pomba e pode também contemplar a beleza do Esposo. Com efeito, quando a jovem possui olhos de pomba, fixa pela primeira vez a beleza do Esposo: «Ninguém pode dizer “Jesus é o Senhor”, senão pelo Espírito Santo» (1Cor 12,3). E ela diz: «Ah! Como é belo o meu amado. Todo ele é delicioso! (cf Ct 5,16) Desde que [te vi] nada mais me parece belo e afastei-me de tudo o que anteriormente contava como belo; nunca mais o meu juízo sobre beleza se perdeu, a ponto de me levar a encontrá-la fora de ti. […] A tua beleza é extensiva a toda a eternidade da vida e o teu nome é: amor dos homens».