«Bebereis do meu cálice»

São Gregório Magno (c. 540-604)papa, doutor da Igreja
Homilias sobre os Evangelhos, n.º 35

Uma vez que hoje celebramos a festa dum mártir, irmãos, centremo-nos na sua paciência. Com efeito, se, com a ajuda do Senhor, nos esforçarmos por manter essa virtude, obteremos sem dúvida a palma do martírio, ainda que vivamos na paz da Igreja. Porque há dois tipos de martírio: o primeiro consiste numa disposição do espírito; o segundo alia a essa disposição os atos da existência. Por isso, podemos ser mártires mesmo sem morrer executados pelo gládio do carrasco. Morrer às mãos dos perseguidores é o martírio em ato, na sua forma visível; suportar as injúrias amando quem nos odeia é o martírio em espírito, na sua forma oculta. Que haja dois tipos de martírio, um oculto, o outro público, a própria Verdade o comprova quando pergunta aos filhos de Zebedeu: «Podeis beber o cálice que Eu hei de beber?» E à sua asserção: «Podemos», o Senhor replica: «Bebereis do meu cálice». Ora, o que significar este cálice para nós, senão os sofrimentos da sua Paixão, da qual diz noutra passagem: «Meu Pai, se é possível, que se aparte de Mim este cálice» (Mt 26,39)? Os filhos de Zebedeu, Tiago e João, não morreram ambos mártires, mas foi a ambos que o Senhor disse que haviam de beber esse cálice. De facto, se bem que não viesse a morrer mártir, João acabou todavia por sê-lo, já que os sofrimentos que não sentiu no corpo os sentiu na alma. Devemos então concluir do seu exemplo que também nós podemos ser mártires sem passar pela espada, se conservarmos a paciência da alma.

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