Santoral
Missa da Noite de Natal
Uma luz brilha em Belém
Descem anjos do céu, ouvem-se cânticos dando glória. Vêm pastores em busca da luz e com eles os humildes da terra. Dissipam-se as trevas na região da noite e surge um novo dia. Levantam-se os homens humilhados, caídos, esquecidos, abandonados. Deus vem ao nosso encontro envolvido nuns panos e deitado numa manjedoura.
LEITURA I Is 9, 2-7 (1-6)
O povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz começou a brilhar. Multiplicastes a sua alegria, aumentastes o seu contentamento. Rejubilam na vossa presença, como os que se alegram no tempo da colheita, como exultam os que repartem despojos. Vós quebrastes, como no dia de Madiã, o jugo que pesava sobre o povo, o madeiro que ele tinha sobre os ombros e o bastão do opressor. Todo o calçado ruidoso da guerra e toda a veste manchada de sangue serão lançados ao fogo e tornar-se-ão pasto das chamas. Porque um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado. Tem o poder sobre os ombros e será chamado «Conselheiro admirável, Deus forte, Pai eterno, Príncipe da paz». O seu poder será engrandecido numa paz sem fim, sobre o trono de David e sobre o seu reino, para o estabelecer e consolidar por meio do direito e da justiça, agora e para sempre. Assim o fará o Senhor do Universo.
O povo da região de Zabulão e Neftali vive uma situação que pode identificar-se com a noite e as sombras. Desprezados por Jerusalém são votados à periferia da vida social, política e religiosa. É ali, na região das sombras, a um povo humilhado, que Deus faz brilhar a sua luz.
Salmo 95 (96), 1-2a.2b-3.11-12.13
O salmo 95 canta a realeza do Senhor que, nesta noite de Natal reconhecemos em Jesus Cristo, nascido em Belém. Os céus e a terra rejubilam de alegria diante do Senhor que vem.
LEITURA II Tito 2, 11-14
Caríssimo: Manifestou-se a graça de Deus, fonte de salvação para todos os homens. Ela nos ensina a renunciar à impiedade e aos desejos mundanos, para vivermos, no tempo presente, com temperança, justiça e piedade, aguardando a ditosa esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo, que Se entregou por nós, para nos resgatar de toda a iniquidade e preparar para Si mesmo um povo purificado, zeloso das boas obras.
Paulo fala a Tito sobre a encarnação de Jesus, a grande manifestação de Deus em favor do seu povo, através da qual faz participantes a todos os homens da sua bem-aventurança. De facto, em Cristo Deus manifesta toda a sua glória, desde a sua encarnação até ao mistério da Cruz onde somos purificados.
EVANGELHO Lc 2, 1-14
Naqueles dias, saiu um decreto de César Augusto, para ser recenseada toda a terra. Este primeiro recenseamento efetuou-se quando Quirino era governador da Síria. Todos se foram recensear, cada um à sua cidade. José subiu também da Galileia, da cidade de Nazaré, à Judeia, à cidade de David, chamada Belém, por ser da casa e da descendência de David, a fim de se recensear com Maria, sua esposa, que estava para ser mãe. Enquanto ali se encontravam, chegou o dia de ela dar à luz e teve o seu Filho primogénito. Envolveu-O em panos e deitou-O numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria. Havia naquela região uns pastores que viviam nos campos e guardavam de noite os rebanhos. O Anjo do Senhor aproximou-se deles e a glória do Senhor cercou-os de luz; e eles tiveram grande medo. Disse-lhes o Anjo: «Não temais, porque vos anuncio uma grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: encontrareis um Menino recém-nascido, envolto em panos e deitado numa manjedoura». Imediatamente juntou-se ao Anjo uma multidão do exército celeste, que louvava a Deus, dizendo: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por Ele amados».
Os anjos vêm do céu anunciar que o Salvador já nasceu. Contam que é um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura. Lucas convida-nos a reconhecer também hoje a presença de Jesus salvador no meio de nós.
Reflexão da Palavra
Isaías tem presente as regiões de Zabulão e Neftali situadas junto à “estrada do mar” que liga, através da Palestina, o Egito com a mesopotâmia. É uma região frequentada por caravanas de comerciantes de todas as nações que exercem a sua influência, política, social e religiosa sobre os Israelitas que ali habitam. A permeabilidade das relações faz com que os judeus de Jerusalém vejam com maus olhos as pessoas desta região. Religiosamente contaminados são um povo humilhado que vive como quem está nas trevas.
Isaías anuncia que, para aqueles que não era suposto, uma luz brilha e transforma em alegria a vida dos que habitam as sombras. Mais tarde iremos ver Jesus a dar início à sua vida pública precisamente nesta região.
É Deus quem faz brilhar a luz nas trevas e aumentar a alegria nos que ali habitam. Esta luz é como a de Madian quando Gedeão pôs em fuga os inimigos. E a alegria é como aquela se vive depois de uma vitória no campo de batalha. Termina a guerra, termina a opressão e recomeça a vida, um menino nasceu.
Este menino tem quatro nomes, “Conselheiro admirável”, “Deus forte”, “Pai eterno” e “Príncipe da Paz”. É um menino dado por Deus ao seu povo. Nele cumpre-se a promessa feita a David, mas de modo ainda mais admirável do que o esperado.
O que se diz deste menino ganha um novo sentido quando aplicado a Jesus e só atinge a plenitude da sua realização nele.
O salmo 95 é um hino à realeza do Senhor, aplicado aqui ao rei que acaba de nascer, Jesus. O salmista convida o céu, a terra, o mar, os campos e as árvores das florestas e tudo o que neles habita, a cantar um cântico novo porque o Senhor vem salvar o seu povo e vem julgar a terra. Esta notícia é para todos, deve ser espalhada pelo arauto em todas as nações e até junto dos pagãos.
A pequena carta dirigida por Paulo a Tito guarda no seu centro este resumo da realização da promessa esperada por toda a humanidade. Deus manifestou-se, quer dizer, na encarnação de Cristo, Deus deu a conhecer a sua glória e tronou os homens participantes da sua bem-aventurança. Na encarnação está já presente a cruz na qual a humanidade é purificada de todas as iniquidades a fim de se apresentar como um só povo diante do Grande Deus.
Paulo afirma na carta a Tito que Jesus é Deus e salvador. Nele manifestou-se a graça de Deus que é garantia do cumprimento da grande esperança que é a participação na bem-aventurança. Para participar dessa graça vale a pena viver com sobriedade, justiça e piedade. Este deve ser o estilo de vida de todos os que aguardam em esperança a manifestação final daquele que nos purificou das nossas iniquidades com a sua entrega na cruz. Nele somos irrepreensíveis e podemos apresentar-nos diante do Grande Deus.
A grande manifestação deu-se com a encarnação de Jesus no seio de Maria, cujo nascimento é relatado por Lucas no evangelho. Um acontecimento político serve de quadro histórico para Lucas dar início à narração do nascimento do Salvador. O decreto do imperador coloca José no caminho de Belém, que Lucas afirma ser a cidade de David, para a valorizar pelo seu papel na história da salvação, mas a cidade de David era Jerusalém.
Para Lucas é importante a referência à manjedoura. Mais do que o nascimento de Jesus, que Lucas resolve rapidamente “chegou o dia de ela dar à luz e teve o seu Filho primogénito”, o lugar onde Jesus é deitado, a manjedoura, fala do lugar onde nasceu o salvador, junto dos animais e dos viajantes que enchiam por completo o lugar reservado às pessoas.
Aquele que nasce é o filho primogénito de Deus, mais do que de José e de Maria. Ele pertence a Deus e não a César, mas cumpre as obrigações impostas pelo imperador. A sua condição de Messias tem uma dimensão espiritual e não política, por isso nasce em Belém, a “casa do pão” e não em Jerusalém, cumprindo do mesmo modo a referência a David que era anunciada na promessa.
Se o nascimento de Jesus é resolvido com uma frase, a notícia da chegada do salvador não pode permanecer no silêncio. Lucas dá grande relevo a este anúncio. A notícia do nascimento vem do céu e não da terra, é o anjo do Senhor quem comunica aos pastores. O medo que se apodera dos pastores revela que estão perante uma manifestação de Deus que lhes confia a notícia destinada a todos e lhes dá um sinal, “encontrareis um Menino recém-nascido, envolto em panos e deitado numa manjedoura”.
O cântico dos anjos revela o que acabou de acontecer e que Paulo traduz com a expressão “manifestou-se a graça de Deus”, Ele mesmo se revelou, mostrou o seu rosto no menino nascido em Belém. E este acontecimento tem repercussões na terra, porque este menino é o “príncipe da paz” como se vê na primeira leitura. No menino nascido em Belém realiza-se a glória de Deus e a paz na terra.
O texto termina com a atitude dos pastores que se puseram imediatamente a caminho de Belém.
Meditação da Palavra
O nascimento de Jesus é o início do cumprimento de todas as promessas feitas pelo Senhor através dos profetas. Nem sempre as promessas se realizam como os homens imaginam. O mais habitual é Deus ultrapassar a imaginação humana e chegar a realizar prodígios maiores do que poderemos alguma vez imaginar.
A vinda do Messias era uma esperança de Israel, mas ninguém espera um Messias pobre, humilde, pequeno, indefeso. Ninguém imagina um Messias que escolhe a noite, as sombras, a humilhação, a periferia, para se manifestar.
Isaías fala para a região de Zabulão e Neftali, estrada do mar, região de sombras e de noite, lugar de morte e humilhação, para anunciar a Luz que vem brilhar sobre a humanidade. “o povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz começou a brilhar”.
Paulo fala a Tito sobre a encarnação de Jesus, reconhecendo que esta é a grande manifestação de Deus em favor do seu povo, através da qual faz participantes a todos os homens da sua bem-aventurança. De facto, em Cristo, Deus manifesta toda a sua glória, desde a sua encarnação até ao mistério da Cruz. É nele, Jesus, que somos purificados de toda a iniquidade para nos podermos apresentar diante do Grande Deus.
Sendo filho primogénito de Deus, Jesus é apresentado por Lucas como verdadeiro homem cumprindo as obrigações cívicas impostas aos cidadãos do império dominador da Palestina daquele tempo. E é também apresentado como pobre que nasce no lugar mais pobre, mais perto dos animais do que dos homens, porque entre os homens já não havia lugar.
O relato do nascimento é simples “chegou o dia de ela dar à luz e teve o seu Filho primogénito. Envolveu-O em panos e deitou-O numa manjedoura”. Mas a notícia do seu nascimento é dada com todo o detalhe. O anjo do Senhor vem do céu e anuncia aos pastores que primeiro se enchem de medo e logo de alegria. Recebem a notícia e vão ao encontro de Jesus conscientes de serem eles os mensageiros desta novidade.
A notícia é fundada nas escrituras. O texto da notícia diz: “nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor”. Este menino deve ser procurado em Belém, a cidade de David, e anunciado a todos, como diz a escritura. Trata-se de uma grande alegria para todos.
Os elementos encontrados nos textos desta noite de Natal colocam-nos perante o mistério de Deus revelado aos homens em Jesus e o quadro do seu nascimento, a contemplação do presépio de Belém, é o caminho para chegarmos a acolher esse mistério que é dom de Deus para os homens. Deus manifesta-se para que o homem participe da sua bem-aventurança.
A notícia do nascimento de Jesus é a manifestação da graça de Deus que nos abre aos mais nobres sentimentos de paz, de justiça e de piedade. Como para os pastores a notícia é para nós oportunidade de encontro com Deus, porque em Jesus o céu desce à terra. Fazendo-se homem no menino envolto em panos, Deus assume a humanidade elevando-a à condição divina. Esta graça enche-nos de alegria porque se trata da salvação gratuita e dada a todos sem exceção.
Receber a notícia transforma-nos em mensageiros. O leitor do evangelho de Lucas, aprende com os pastores a escutar a palavra que vem do céu, a encher-se de alegria e a procurar o encontro com aquele que é o centro do evangelho, Jesus Cristo. E decide-se a ir comunicar a todos, com alegria e gratidão, louvando a Deus, a alegre notícia que mudou as suas vidas.
Nesta noite de Natal compreendemos que Deus se revela àqueles que não dão garantias de credibilidade, como os habitantes da região de Zabulão e Neftali, como os pobres de Belém que enchem a hospedaria, como os pastores daquele tempo.
A notícia do nascimento de Jesus, que interessa a todos os homens, interessa primeiramente aos que andam nas trevas, nas sombras da morte, aos humilhados, que vivem nas periferias das grandes cidades e à margem das oportunidades que garantem uma vida estável. Que hoje, ao sair, sejamos conduzidos com alegria ao encontro daqueles que se julgam indignos de receber o salvador e não acreditam que Jesus veio precisamente para eles.
Rezar a Palavra
Vem à noite e quebra as sombras deste mundo. Manifesta a tua graça no rosto dos humildes desta terra. Que a tua glória preencha os vazios e a tua luz a escuridão dos corações. Faz-nos mensageiros da boa nova que fala de ti, Deus próximo, amigo e bom.
Compromisso semanal
Quero ver-te nas palhas dos presépios humanos.
Missa do Dia
Que a tua luz brilhe em mim
O ato de ver, por ser tão natural e não exigir nenhum tipo de esforço, faz-nos crer que conseguimos ver tudo e que apenas existe o que os nossos olhos podem alcançar. No entanto, já nos aconteceu passar pela experiência de olhar e não ver, de andar à procura e não darmos conta de que está mesmo debaixo dos nossos olhos aquilo que procuramos.
“A Deus, nunca ninguém o viu”. Esta conclusão de João no seu evangelho, mostra que os nossos olhos não podem ver tudo e que, para além de tudo o que os nossos olhos podem alcançar, há uma realidade que, existindo, não pode ser vista com os olhos. Para vermos a Deus é necessário que nos seja revelado pelo “Filho Unigénito, que está no seio do Pai” porque ele “é que o deu a conhecer”.
“O Verbo é a Luz verdadeira que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina” (Jo 1,9).
LEITURA I Is 52, 7-10
Como são belos sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz, que traz a boa nova, que proclama a salvação e diz a Sião: «O teu Deus é rei». Eis o grito das tuas sentinelas que levantam a voz. Todas juntas soltam brados de alegria, porque veem com os próprios olhos o Senhor que volta para Sião. Rompei todas em brados de alegria, ruínas de Jerusalém, porque o Senhor consola o seu povo, resgata Jerusalém. O Senhor descobre o seu santo braço à vista de todas as nações, e todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus.
O Senhor volta para Sião. As ruínas de Jerusalém já podem gritar de alegria porque o Senhor volta para a sua casa, vai habitar o seu templo. Quem o diz é o seu mensageiro e dizem-no também as sentinelas que, das suas guaritas, já veem, sem ver, o Senhor com os seus próprios olhos. Já não é uma promessa, é a realização da promessa. O próprio Senhor vem e diz: “Aqui estou”.
Salmo responsorial Sl 97 (98), 1.2-3ab.3cd-4.5-6 (R. 3c)
O Senhor chega vitorioso à sua cidade santa. Conquistou a vitória com o seu santo braço. E todos podem contemplar este feito grandioso do Senhor. Esta vitória é salvação para todos os confins da terra.
LEITURA II Heb 1, 1-6
Muitas vezes e de muitos modos falou Deus antigamente aos nossos pais, pelos Profetas. Nestes dias, que são os últimos, falou-nos por seu Filho, a quem fez herdeiro de todas as coisas e pelo qual também criou o universo. Sendo o Filho esplendor da sua glória e imagem da sua substância, tudo sustenta com a sua palavra poderosa. Depois de ter realizado a purificação dos pecados, sentou-Se à direita da Majestade no alto dos Céus e ficou tanto acima dos Anjos quanto mais sublime que o deles é o nome que recebeu em herança. A qual dos Anjos, com efeito, disse Deus alguma vez: «Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei»? E ainda: «Eu serei para Ele um Pai, e Ele será para Mim um Filho»? E de novo, quando introduziu no mundo o seu Primogénito, disse: «Adorem-n’O todos os Anjos de Deus».
O anúncio feito pelas sentinelas de Isaías era apenas uma imagem do verdadeiro anúncio. Deus falou de muitos modos no passado, mas agora fala por seu filho. Esplendor do Pai, o filho está na origem do universo e sustenta todas as coisas com a sua palavra. Veio ao mundo, sem deixar de ser filho, e purificou os homens do pecado, por isso, deve ser adorado.
EVANGELHO Jo 1, 1-18
No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princípio, Ele estava com Deus. Tudo se fez por meio d’Ele, e sem Ele nada foi feito. N’Ele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. A luz brilha nas trevas, e as trevas não a receberam. Apareceu um homem enviado por Deus, chamado João. Veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos acreditassem por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz. O Verbo era a luz verdadeira, que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem. Estava no mundo, e o mundo, que foi feito por Ele, não O conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não O receberam. Mas àqueles que O receberam e acreditaram no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Estes não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós. Nós vimos a sua glória, glória que Lhe vem do Pai como Filho Unigénito, cheio de graça e de verdade. João dá testemunho d’Ele, exclamando: «É deste que eu dizia: ‘O que vem depois de mim passou à minha frente, porque existia antes de mim’». Na verdade, foi da sua plenitude que todos nós recebemos graça sobre graça. Porque, se a Lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo. A Deus, nunca ninguém O viu. O Filho Unigénito, que está no seio do Pai, é que O deu a conhecer.
Pela leitura do prólogo de João saímos do tempo e do espaço dos homens para irmos até ao tempo e coração de Deus. Ali, Deus é princípio e é Palavra e além dele não existe mais nada, porque ele é a origem de tudo. Na primeira noite Deus venceu as trevas com a Palavra e fez surgir a Luz. E na plenitude dos tempos, rompeu as trevas com a luz que é a própria Palavra, o Verbo, que é Filho e faz filhos aqueles que o receberam e acreditaram no seu nome.
Reflexão da Palavra
A liturgia deste dia de Natal, em que celebramos o nascimento de Jesus, apresenta a salvação de Deus como Palavra que chega até nós. Na primeira leitura é o mensageiro que traz a boa nova e as sentinelas gritam a chegada da salvação. O seu grito revela que o Senhor renasce das cinzas e faz renascer das cinzas o seu povo, restaura e renova a sua cidade santa. Não acreditar neste poder de Deus é não ver.
O Senhor que parecia vencido e desterrado do seu templo pelo poder dos homens que dominam o seu povo, vai regressar ao seu templo, vai restaurar as ruínas da cidade, vai restaurar o seu povo. A sua chegada já pode ser vista por todos aqueles que escutam o seu mensageiro e dirigem para ele o seu olhar. Esta manifestação do Senhor, que levanta o seu braço diante das nações, pode ser vista por todos os povos. O Senhor que vem, é salvação para todos.
Cantar é o sinal da alegria. Hoje canta-se a certeza da salvação que vem ao mundo em Jesus, por isso, no salmo afirmamos que “todos os confins da terra viram a salvação do nosso Deus”. É uma certeza. A liturgia celebra a salvação que já chegou até nós e que todos já podem contemplar e cantar.
A salvação chega na Palavra, porque o nosso Deus é um Deus que fala, ele próprio é Palavra. A carta aos Hebreus diz que Deus falou de muitos modos. Fala através da obra da criação, fala através dos anjos, fala através dos profetas. São muitos os modos e os mensageiros que trazem a Palavra, a Boa Nova, que anunciam a salvação. No entanto, “nestes dias, que são os últimos, falou-nos por seu Filho”.
Quem é o Filho? A carta aos Hebreus diz que é o “herdeiro de todas as coisas” por meio do qual Deus “criou o universo”. É “o esplendor da glória” de Deus, “imagem da sua substância” que “tudo sustenta com a sua palavra poderosa”. É o “Primogénito” que veio ao mundo e a quem Deus disse: “Tu és meu Filho, eu hoje Te gerei”.
O evangelista João diz que este filho de Deus, que também é Deus, é “o Verbo”, a Palavra, que desde o princípio está em Deus e é Deus. Ele é a Palavra que estava no princípio a dar origem a todas as coisas.
A Palavra, diz João, é também a vida e a vida é luz que brilha nas trevas, que ilumina todo o homem. O Verbo, Palavra do Pai, veio ao mundo, “fez-se carne e habitou entre nós”. A chegada do Verbo é a chegada da graça e da verdade que revela a glória de Deus, que ninguém viu, mas que o Filho, o Verbo, a Palavra, pode revelar.
Como no princípio, na criação, também agora, nestes dias que são os últimos, a Palavra criadora de Deus entra em confronto com as trevas que rejeitam a luz, com o mundo que foi feito por ele mas que não o conheceu, com os homens que sendo seus não o receberam. No entanto, aqueles que nele acreditaram tornaram-se novas criaturas porque da “sua plenitude é que todos nós recebemos graça sobre graça“.
Agora, a Palavra veio ao mundo e acampou entre os homens. A Palavra fez-se carne e provoca um novo início, começa um novo dia, desponta uma nova luz que rompe as trevas, surge uma nova criação de entre as ruínas na velha criação, surge um homem novo.
Meditação da Palavra
A humanidade ferida pela guerra, pela inimizade, pelo egoísmo; espezinhada pelo desprezo para com os mais fracos, os mais pobres, os últimos; manchada com o desrespeito pela a vida, pela liberdade e pelo direito à integridade, não foi abandonada por Deus. Em algum momento podemos ser levados a acreditar que Deus se ausentou, abandonou o seu projeto e virou as costas ao homem, mas isso não é verdade.
As notícias que nos chegam diariamente, de perto e de longe, mostram a escuridão que cobre os povos, a cegueira que impede os olhos de ver mais além do horizonte e o desespero diante da realidade concreta que muitos são obrigados a viver. Estas notícias podem-nos fazer crer que não é possível a esperança, que não é possível um mundo diferente, um homem novo. O conhecimento do ódio que o homem é capaz de experimentar ao ponto de infligir ao seu semelhante o sofrimento da guerra que destrói vidas, famílias, futuros e produz milhares de mortos, de órfãos, solidão e desespero, pode fazer-nos desacreditar da humanidade.
O Senhor, porém, não abandonou o seu povo, pelo contrário, ele é o Deus connosco e mostra-se aos nossos olhos em Jesus, nascido em Belém, Palavra eterna do Pai, Palavra feita carne em Maria. Ele é a razão de toda a esperança. À sua chegada as sentinelas levantam a voz, as ruínas de Jerusalém gritam de alegria, porque nele, é o Senhor quem mostra o seu “santo braço”, recriando tudo com a sua luz.
A Palavra é, agora, Deus feito homem, palavra definitiva que vem salvar pela “purificação dos pecados”, Palavra que ecoa aos nossos ouvidos para que, escutando, acreditemos nele e recebamos o poder de nos tornarmos Filhos de Deus.
Nestes que são também os últimos dias, é a nós que esta Palavra se dirige, é para nós o Verbo encarnado, é para a nós a luz que vem de Belém. Se outrora Deus falou de muitos modos e nos últimos dias falou por seu Filho, hoje, o Filho fala através de nós os que recebemos “da sua plenitude, graça sobre graça”.
Se o Verbo que no “princípio” deu origem a uma humanidade que não o quis receber quando ele, por Maria, veio habitar entre nós, hoje, somos nós, homens novos, nascidos da Palavra que se tornou batismo, quem, em nome de todos os homens, somos chamados a recebê-lo e a torná-lo presente no meio do mundo para que a sua glória brilhe diante dos homens.
Se “a Deus, nunca ninguém o viu” e só “o Filho Unigénito, que está no seio do Pai, é que o dá a conhecer”, hoje, nós que pela fé nos tornámos também filhos de Deus, somos chamados, como Maria, a percorrer os caminhos da história para levar a todos o verdadeiro rosto de Deus, o rosto de Jesus nascido em Belém, para que o adorem todos os povos da terra.
Oração
No dia em que celebramos a vitória da luz, do amor e da verdade sobre a noite escura dos homens fechados no egoísmo que provoca as guerras e multiplica o vazio e a solidão, faz de nós, Senhor, arautos, sentinelas vigilantes que anunciam a aurora de novos tempos, porque nos fizeste teus filhos e porque podemos ver o teu verdadeiro rosto no Emanuel, o Deus connosco, o Filho de Maria nascido em Belém.
Compromisso para a semana
Iluminados por Cristo queremos recebê-lo em nossa casa, recebendo os irmãos que vivem na solidão e no abandono porque não têm família com quem partilhar o Natal e porque são rosto de Deus para nós.
Via: aliturgia.com