Querer pôr a esperança e a confiança em bens passageiros é querer fazer fundações em água corrente. Tudo passa; só Deus permanece. Agarrarmo-nos ao que é transitório é desligarmo-nos do que é permanente. Quem é o homem que, arrastado no turbilhão de um rápido, consegue manter-se firme no seu lugar no meio dessa torrente fragorosa? Se não quisermos ser levados pela corrente, temos de nos afastar de tudo o que passa; senão, o objeto do nosso amor constranger-nos-á a chegar ao que precisamente queremos evitar. Aquele que se agarra aos bens transitórios será inevitavelmente arrastado para onde vão ter essas realidades a que se apega. A primeira coisa a fazer é, pois, abstermo-nos de amar os bens materiais; a segunda, não pormos total confiança naqueles bens que nos são confiados para serem usados e não para serem desfrutados. A alma que se prende aos bens perecíveis cedo perde a sua estabilidade. O turbilhão da vida atual arrasta quem nele se deixa ir, e é uma tonta ilusão querer manter-se de pé quando se é levado nesta corrente.
São Gregório Magno (c. 540-604) papa, doutor da Igreja – Escritos morais sobre Job, 34