Dos Comentários de Santo Ambrósio, bispo, sobre os salmos
(Salmo 1, 4.7-8: CSEL 64,4-7) (Sec. IV)
Ainda que toda a Escritura divina respire a graça de Deus, é-nos particularmente agradável o Livro dos Salmos. Lembremos como procedeu o próprio Moisés: para descrever as obras grandiosas dos antepassados recorreu à prosa; mas para exprimir a sua admiração pela memorável travessia do Mar Vermelho com todo o povo de Israel, vendo submergido o rei Faraó com todo o seu exército, e consciente de que tinha realizado uma acção superior às suas forças, sentiu-se profundamente inspirado e cantou ao Senhor um hino triunfal. Também Maria, a profetisa, tomando o tamboril, exortava as outras mulheres dizendo: Cantemos ao Senhor, porque fez brilhar a sua glória; Ele precipitou no mar o cavalo e o cavaleiro.
A história ensina, a lei instrui, a profecia anuncia, a advertência corrige, a moralidade persuade; mas o Livro dos Salmos, como síntese de tudo isto, é medicina geral da salvação humana. Quem os lê encontra sempre um remédio especial para curar as suas feridas. Quem quiser lutar, veja o que se diz nos salmos e contemplará neles como que um ginásio comum das almas e estádio das virtudes, onde se encontra todo o género de exercícios, e escolha para si o que lhe parece mais apto para alcançar a coroa da vitória.
Se alguém quiser recordar e imitar os feitos grandiosos dos antepassados, encontrará toda a história dos nossos pais resumida num só salmo, cuja leitura lhe oferece um verdadeiro tesouro para a memória. Se alguém quer compreender a força do amor à lei, que está toda contida no vínculo da caridade (pois quem ama o próximo cumpre a lei), leia e admire os grandes sentimentos de amor com que um só homem se expõe a graves perigos para afastar a ignomínia de todo o povo, e nesta prova triunfal da virtude reconhecerá a glória incomparável da caridade.
E da sua dimensão profética, quanto se poderia dizer! O que outros anunciaram por meio de enigmas, parece que só ao Salmista foi prometido clara e abertamente: que o Senhor Jesus havia de nascer da sua descendência, como lhe disse o Senhor: Colocarei no teu trono um descendente da tua família. Nos salmos não só se anuncia que Jesus nasce para nós, mas também que aceita a paixão redentora do seu corpo, morre e é sepultado, ressuscita, sobe ao Céu e senta-Se à direita do Pai. O que nenhum homem ousaria dizer, só o Salmista o anunciou e depois o pregou o próprio Senhor no Evangelho.